sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Lucinda Gomes Barbosa Ahukarié Mulher Guinense e economia informal



ENCONTRO MUNDIAL - MULHERES DA DIÁSPORA

"Expressões Feminina da Cidadania"


EMPREENDEDORISMO no Feminino - MULHER GUINEENSE E ECONOMIA INFORMAL

Lisboa, 24 e 25 de Outubro
Introdução
A abordagem do tema " Empreendedorismo no Feminino " deverá cingir-se no contexto nacional guineense, bem como a sua relação com a economia informal no seio das mulheres nos diferentes sectores de atividades.

O empreendedorismo surge como um processo, com a sua dinâmica própria no contexto socioeconómico e cultural da Guiné-Bissau.

O processo da inserção da mulher no mercado de trabalho, nas lideranças, no acesso ao ensino superior, acontece progressivamente a partir da década de 1960, com a independência dos países africanos e com a luta armada para a libertação dos países da língua portuguesa, no qual a Guiné – Bissau fez parte.
Durante a Luta Armada pela Independência, que teve o seu início em 1963, influenciado com a política da mulher dos países da orientação Socialista, consciencializou-se homens e mulheres guineenses sobre a "Política da Emancipação da Mulher"; com a referida política as mulheres conseguiram conquistar lugar e lutar lado a lado com os homens, pegando nas armas e pertencendo o Comité Executivo da Luta. Com essas atitudes surgiram Mulheres Heroínas Guineense e Mulheres com o Estatuto de Combatentes da Liberdade da Pátria.


Após a independência total em 1974, a Constituição da República da Guiné – Bissau, estabelece a "Igualdade de Sexo entre homem e mulher" em todos os aspetos da vida social, económico, político e cultural.

Apesar dos princípios constitucionais, que estabelece "Igualdade de Gênero", continua a existir resistência por parte dos homens em não ceder espaço, contudo, algumas mulheres conseguiram conquistar lugares de destaque, assumindo funções de Presidente da ANP, Vice - Presidente de ANP, Deputadas.

Nos anos de 1985 à 1986, foram marcadas com grandes decisões políticas e económicas; O Governo de PAIGC, partido único no poder decidiu pôr fim a economia planificada em que o Estado é que controlava o comércio e toda economia; aboliu as restrições comerciais, reduzindo o controlo de Estado nos comércios e na economia, através da liberalização do comércio e economia do mercado - livre concorrência.
O Programa de Ajustamento Estrutural (PAE), adotado pelo Governo Guineense a partir de 1987, não obteve os resultados esperados. O Programa não levou em conta o contexto socioeconómico no qual se inseria, considerando que exigia para a sua realização das condições socioeconómicas inexistente na Guiné – Bissau. Sendo o mercado desorganizado, toda a sua funcionalidade repousou sobre mecanismos das leis desse mesmo mercado, cujo resultado foi a instauração da especulação1.

1 EMBALÓ, Filomena, " Os desafios do Programa de Ajustamento Estrutural". Soronda – Revista de Estudos Guineenses. N16, Bissau, Julho 1993, pp51-32.


2 Vide Patrícia Gomes
Entre várias medidas do PAE implantadas na Guiné – Bissau, três iriam revelar-se especialmente importantes para a compreensão do crescimento exponencial do fenómeno da economia informal:

- a adoção de uma política fiscal restritiva, o que entre coisas implicou despedimentos dos funcionários públicos;

- redução dos investimentos nos sectores como a saúde e a educação;

- Liberalização dos preços, do comércio e dos mercados, o que significou o aumento das oportunidades de negócio;

- A desvalorização da moeda nacional, cujo principal resultado foi o aumento dos preços dos produtos importados2.

Se os baixos salários e os atrasos no pagamento já davam aos trabalhadores razões suficientes para procurarem outras fontes de receitas, esta política reforçou a crise no seio das famílias e pôs em causa as responsabilidades sociais dos homens, chefes da família em relação ao próprio agregado familiar. O não cumprimento das responsabilidades familiares por parte dos chefes de família levou a que as mulheres se vissem " obrigadas" a ter de recorrer a outras atividades remunerativas a fim de

garantir a sobrevivência do núcleo familiar. Um dos efeitos deste processo foi a crescente autonomia conquistada pelas mulheres nas praças3.
3 HAVIK, Philip, "Relações de género e comércio: estratégias inovadoras de mulheres na Guiné – Bissau". Soronda – Revista de Estudos Guineenses. N. 19, Janeiro 1995, pp. 33-34.


Com o processo da liberalização económica e com a mudança política para o multipartidarismo em 1992, tiveram um impacto importante no sistema económico e social no seio das mulheres guineenses.

Em 1992, foi criada em Bissau, a Associação das Mulheres de Atividade Económica – A.M.A.E., a primeira organização de mulheres de atividade económica, cujo objetivo promover a independência económica das mulheres; a promoção e a valorização dos produtos agrícolas e artesanais, através do mecanismo da poupança e da solidariedade.

ECONOMIA INFORMAL

Na Guiné – Bissau, a visão do sector informal como um fenómeno relativo à "livre iniciativa" consolidou-se em boa parte graças as mudanças de conceção das políticas de desenvolvimento económico no início dos anos oitenta, para as quais o FMI e o Banco Mundial contribuíram de forma decisiva. Em vez de macro – Projetos nacionais que requeriam grande necessidade de planeamento, de investimento e de empréstimos, começou-se a desenhar, a partir desses anos, um modelo centrado nas pequenas iniciativas, como motor do desenvolvimento. Por essa razão, o sector informal teve um espaço importante nos programas de estabilização adotados pelos organismos financeiros internacionais, porque a nova conceção de desenvolvimento elaborada nestes programas pressupôs a existência de um amplo sector social apto à livre iniciativa, conceito então privilegiado pelas medidas de liberalização lançada por estes programas.

Apesar da sua inquestionável contribuição para a economia nacional, foi só a partir da década de oitenta (período que coincide com as reformas macroeconómicas e as medidas de liberalização), que o interesse em relação à questão da economia informal começou a ganhar contornos bem definidos. Foram importantes nesse sentido as pesquisas levadas a cabo pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, que deu o primeiro grande contributo científico ao tema.

Esta mudança teve um reflexo imediato no comportamento e na atitude dos agentes e dos operadores económicos, e não menos importante, nas estruturas das famílias especialmente entre jovens e as mulheres nas cidades e nas zonas rurais. A possibilidade de poder criar e gerir negócios próprios e de poder atuar num ambiente onde o Estado não tem grande poder em termos de controlo fiscal, atraiu parte da população para as atividades comerciais e económicas.

70% da população ativa opera no sector informal, da qual a maior parte das famílias depende, direta ou indiretamente, a economia informal apresenta como a mais

simples e a menos burocrática, contribuindo de forma decisiva para a resolução imediata dos problemas quotidianos de sobrevivência das populações como a alimentação, o emprego, a saúde e a escolaridade.

Na opinião de Mamudo Jao – Diretor do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, o que caracteriza a economia a economia informal " é não existência de registos, a sua mobilidade em termos de espaço físico e as mudanças no tipo de atividades praticadas em função da demanda do mercado, tornando, por isso, o seu controlo e seguimento por parte do Estado muito complicado".

O aumento contínuo das atividades económicas do sector informal e a necessidade de um mecanismo financeiro de apoio levaria à criação em 2002 de uma instituição financeira não bancária, denominada "Bambaram", cuja finalidade é a de arrecadar as poupanças das pequenas empresárias do sector informal para a concessão de crédito e a educação económica e social dos seus membros.

Esta cooperativa nasceu graças às iniciativas de mulheres pertencentes a AMAE e a quatro associações do sector informal.

De acordo com o estudo sobre o impacto da economia informal na redução da pobreza e da exclusão social na Guiné – Bissau, podem ser consideradas três categorias de atividades informais:

1. Atividades que garantem a sobrevivência: são predominantes da economia informal e com a maior incidência no mundo rural. São geralmente consideradas atividades pré-empresariais, de subsistência e auto – emprego. Constituem uma importante fonte de recursos e rendimentos para as famílias, sobretudo nas áreas rurais e nos centros semiurbanos. São praticadas em períodos sazonais, baseadas em técnicas tradicionais e mercados locais. Têm pouca ou quase nenhuma perspetiva de crescimento e são praticadas essencialmente por mulheres. São exemplo deste tipo de atividade a comercialização de produtos agrícolas sazonais e de aves domésticas;

2. Micro – empresas: empregam normalmente poucos trabalhadores familiares aprendizes e por vezes um ou mais trabalhadores permanentes. São as chamadas atividades do sector informal "real", pois misturam o tradicional e o moderno, mas com técnica rudimentar. Geralmente não têm acesso ao capital, têm competências limitadas e carecem de gestão profissional. Este tipo de atividade concentra-se sobretudo nas cidades, nos centros semiurbanos e nos centros regionais. Algumas delas desenvolvem competências empresariais. Alguns exemplos de microempresas são as pequenas lojas de produtos alimentares, trabalhadores de metais, carpinteiros, alfaiates, mecânicos de automóveis e vários serviços de reparação (como rádios, televisores, carros, pneus);

3. Pequenas e médias empresas: são as empresas que empreguem geralmente mais de dez trabalhadores. Usam tecnologias modernas, pelo menos em alguns segmentos da produção ou da transformação. Os seus serviços podem ser simples ou complexos. Estão quase sempre a margem do sector informal e quase sempre são oficialmente registadas e pagam alguns impostos.

 
Concentram-se geralmente nas cidades. Exemplo deste tipo de empresas são as empresas de transporte público, empresa de construção, pequenas indústrias de processamento de castanhas de cajú, fábricas de venda de materiais4.


4 Patrícia Gomes, Mulher e Economia Informal
5 http://www.youtube.com/watch?v=U9MYvwL0idc&list=PL2CBBD7C16725B0AC&index=1




Testemunhas de Mulheres empreendedoras na diáspora - Portugal


1ª D. Leonor Delgado (modista) e filha Neide Delgado (estilista) – guineenses residentes em Portugal5

D. Carolina Barbosa - Uma mulher empreendedora – imigrante guineense

Chamo-me Carolina Barbosa, tenho 46 anos e tenho três filhos que são a minha vida. Nasci, cresci e fiz os meus estudos em Bissau onde terminei o ensino secundário em 1987. Tenho formação em estenografia legislativa e secretariado administrativo. Descobri a paixão pelo cabelo quando abri o meu primeiro salão de cabeleireiro em Bissau há 20 anos. Á partida foi uma sociedade que mais tarde passou para as minhas mãos e comecei a gerir sozinha. Correu tudo muito bem até 1997 altura que sai de férias para Portugal. Infelizmente aconteceu o inesperado, "a guerra na cidade de Bissau" Fui obrigada a ficar. Para a minha sobrevivência e da minha filha que na altura tinha 5 anos arranjei o meu primeiro emprego num cabeleireiro em Odivelas, alguns meses depois veio a fechar as portas, e consegui outro logo no mesmo ramo no centro de lisboa. Dois anos depois veio a fechar também por opção da proprietária e ai fui para o desemprego, na altura sem documentos legais que me facilitassem a obtenção de emprego, pois eu não desisti continuei a minha luta para a sobrevivência. Fui trabalhar para um Call Center na tv cabo depois desisti porque não era o que eu procurava, fui fazer o curso de administrativa e comecei a trabalhar num escritório de prestação de serviços, alguns meses depois já não estava a achar graça nenhuma de estar sentada em frente a um computador e telefone o dia todo. Resolvi deixar esse emprego. Não era o que gostava. Como disse no princípio, a minha paixão é sem dúvida ser cabeleireira. Então a partir daí convenci a mim mesma que seria onde me devia focar. Voltei a trabalhar de novo num salão em lisboa até formar a minha carteira de clientes, ganhar experiencia e avançar com a minha decisão que é o sonho de criar o meu próprio emprego e consequentemente posto de trabalhos também para mais pessoas. Não foi fácil no princípio e até hoje ainda existem altos e baixos por causa da crise económica que existe no país, mas com força de vontade persistência e muita dedicação consegui até hoje manter o nível do cabeleireiro e das pessoas que comigo colaboram todos os dias o ano inteiro. Faço questão de primar pela qualidade e por isso mantenho clientes fiéis há mais de 10 anos, isso pra mim é uma vitória e posso garantidamente considerar-me uma empreendedora de sucesso.




Entrevista as Mulheres Empreendedoras de Bissau no Âmbito da Economia Informal


3º A Sr.ª Fátima Camará de Barros, Presidente da Confederação de Associação de Mulheres de Atividades Económicas, disse que, a Organização passou de Associação para Confederação e passa a contar com 152 Associações e algumas redes de Federações que estão filiados na AMAE.


Que AMAE trabalha essencialmente na atividade económica e tem diferentes tipos de associados, nomeadamente: desde horticulturas, Tintureiras, comerciantes de vestuários, Pasteleiras; são mulheres que dedicam nos pequenos comércios que são denominados "comércio de sobrevivência", que não envolve muito dinheiro, mais no seu dia-a-dia não falta dinheiro para o sustento e saúde da família, para escolarização dos filhos.

Que AMAE recebe apoio da Cooperação Francesa, Fundo Canadiano, Câmara de Comércio e Indústria da Guiné-Bissau, outras Organizações e também do Banco Regional da Solidariedade (BRS), que tem concedido as mulheres pequenos créditos. Com a situação de 12 de Abril de 2012, o apoio a Confederação AMAE ficou comprometido, por causa do bloqueio a que o país foi sujeito. O crédito com o Banco BRS ficou também comprometido após 12 de Abril, a situação do país complicou e afetou nos negócios e nas atividades económicas das mulheres, no qual, não conseguiram honrar os seus compromissos, incluindo as grossistas dos pescados que solidariamente compravam e davam emprestado as mulheres revendedeiras que vendem peixe ao mercado; continuam a organizar feira, fazendo exposição de diversos produtos nacionais (compotas, sumos de frutas, castanhas e demais produtos transformados).

Continua a acreditar de que é possível produzir em quantidade e em qualidade, porque tem associações capazes, isto é, desde que tenham equipamentos para transformação e armazém para conservação de produtos.

Junto se apresenta as imagens de algumas exposições da AMAE:
4º A Sr.ª Francisca Pereira – Combatente da Liberdade da Pátria e proprietária de Micro empresa denominada " Atlântico Cajú Limitada" – é uma unidade de processamento e transformação de castanhas de cajú. Disse que - a intenção que levou a criar o próprio negócio, era para assegurar uma atividade no período da reforma, assim que deixar de exercer o cargo político; organizar a sua vida económica, contribuir para a economia do país e bem-estar social, dando emprego para jovens e mulheres.


Que em 1996, deu – se início a preparação da criação da microempresa com o apoio da Fundação guineense para o Desenvolvimento Industrial (FUNDEI), criado na Guiné – Bissau, pelo Governo Sueco em parceria com o Governo Guineense para incentivar o desenvolvimento económico no País, tecidos empresariais, emprego jovem e mulheres.

A Sr.ª Francisca Pereira apresentou projeto da unidade fabril de processamento de castanha de cajú à FUNDEI, que tem como objetivo- "promover e financiar projetos de investimento no domínio industrial; apoiar a divulgação tecnológica; promover assistência técnica e ações de formação; e tendo como a áreas de especialização – Micro, pequenas e médias empresas nos setores da indústria, turismo, hotelaria, pesca e serviços; e assim, estando o projeto em conformidade, acabou por ser aprovado, por ser atividade de processamento de castanhas de cajú.

Que após a aprovação, financiado pelo FUNDEI, cerca de trinta pessoas receberam formação nas áreas da técnica de produção, gestão e administração no Centro de Formação da referida Instituição em Quinhamel.

Que após a formação, FUNDEI financiou a instalação e equipamentos para a empresa à título de empréstimo, sem estabelecer o período rigoroso do pagamento de crédito.

Que o "Atlântico Cajú Limitada" iniciou a sua produção em 1997, com trinta funcionários e no mesmo ano, iniciou a exportação de duas caixas – 40kg por semana de amêndoa de cajú salgado para um Supermercado em Guiné Conakry.

Que a guerra de sete de Junho de 1998 vandalizaram e levaram todo o equipamento e desapareceram todo o produto acabado, acerca de 10 caixas de amêndoas de cajú e 300 sacos bruto de castanhas cajú.

Em 2001, solicitou a retoma de atividade e após a avaliação de prejuízos por parte de FUNDEI, e esta instituição voltou a reparar a instalação e reequipar de novo a unidade, contudo, a produção continuava a ser muito difícil por causa da capacidade de compra de matérias-primas. Após a retoma enquadrou 60 trabalhadores e entre eles 60% são mulheres.

Por uma ação conjunta mais eficiente decidiu-se constituir a Associação de transformadores de cajú (ATC) e é composto de 13 Microempresas, provenientes de diferentes Regiões do País.

Que em 2012, a ATC estabeleceu um acordo com o Governo da Guiné – Bissau, através do Ministério do Comércio e Indústria, com a FUNDEI e Camara de Comércio Indústria e Agricultura, para a formação em matérias de produção e administração pelos formadores de UEMOA. Foram formados proprietários e trabalhadores. Após a formação, em Junho de 2012, a Unidade retomou a produção.

Que a ATC estabeleceu o acordo com a FUNDEI para fornecer matérias-primas, disponibilizar fundo para garantir a produção e criação de um Centro de Promoção de castanhas de cajú, a estucagem selecionamento, embalagem e exportação.

A ATC-Cajú não tem de momento uma autonomia de exportação, e essa função está a cargo do Centro de Promoção de Castanhas de Cajú, que ocupa de embalagem, estucagem e é gerido pelo FUNDEI; cabe as empresas nomear junto do Centro delegados para efeito do controlo.

A perspetiva da Direção de Fábrica "Atlântico Cajú Limitada" é tornar extensivo a instalação e dar melhores condições de trabalho a fim de permitir o aumento da produção.

Atendendo o carater informal e a fase organizativa, a Unidade tem beneficiado da isenção da contribuição fiscal.
4º A Sr.ª Marcelina Pascoal da Cunha – Funcionária do Ministério da Agricultura, Diretora Regional de Sector Autónomo de Bissau – disse que na Cintura Verde da Granja Pessubé trabalha com 4 mil mulheres na sua zona de intervenção e apoiam nas seguintes atividades:


- Na sensibilização permanente durante toda a época de chuva e época seca, visto que as mulheres trabalham durante todo o ano, praticando agricultura de sobrevivência da família;

- Na alfabetização;

- Ao nível das sementes;

-Na horticultura;

Com os referidos apoios as mulheres têm melhorado no seguimento da técnica; respeitando as regras, que comece da limpeza, fazer viveiro, transplante, etc.

É de informar de que essas mulheres se agrupam em associações, nos quais algumas são apoiadas pela DEVOTEC, Reino de Espanha, AMBA, Cintura Verde, FAO, em materiais agrícolas e de alfabetização .

As mulheres alegam que, as atividades da horticultura rendiam muito, sobretudo no período antes e depois do Natal; mas que com o golpe militar de 2012, a situação financeira tornou difícil tanto para os consumidores como para elas, porque baixou consideravelmente o poder de compra.

Considerações Finais

As mulheres têm adquirido posições de destaque na economia e detém atualmente uma fatia importante no país. Existe um reconhecimento do governo e cidadãos guineenses, do papel das mulheres na família e no desenvolvimento do País.

Com o aumento da produtividade das associações das mulheres, permitiu um financiamento do Mercado de Legumes na "Granja Pessubé " e um Centro de transformação e conservação de produtos hortofrutícolas. Os referidos empreendimentos foram financiados pela União Europeia, Reino de Espanha e Banco de Africa para o Desenvolvimento

Nas entrevistas realizadas constatou-se o espírito empreendedor das referidas mulheres, que podem ser descritas como persistentes, com alto desejo de realizações e independência, ativas, persuasivas, inovadoras, adaptáveis as mudanças e acreditam ainda no futuro e no fruto das suas ações, apesar de tantas dificuldades por causa de permanente instabilidade que assola o país.

Torna-se evidente, de que com o associativismo numa economia informal organizada e com persistência é possível fazer gerar o rendimento

AGRADECIMENTO

Aproveito este precioso momento para agradecer a Comissão Organizadora através da Dr.ª Manuela Aguiar pelo convite formulado a minha pessoa de poder contribuir na abordagem do tema sobre a participação pela positiva da mulher guineense no país e na emigração no âmbito do desenvolvimento económico e social.

O meu agradecimento especial para a Fundação Pro Dignitate, por ser através desta organização que recebi o convite de expor e dar a conhecer as mulheres de outra parte do globo um pouco sobre a luta e os desafios da Mulher guineense.

Sempre foi um prazer trabalhar com a Fundação, como já aconteceu na Guiné-Bissau, em parceria com a Rádio Sol Mansi, me ter solicitado a formação aos jovens Jornalistas de "Rádios Comunitários" da Guiné –Bissau, em matéria de tráfico e consumo de droga.

Muito Obrigada

Lucinda Gomes Barbosa Ahukarié

barbosaahk@hotmail.com

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Entrevista a Constância Néry


Entrevista a Constância Néry por Ricardo Varela  Pinto de Sá, aluno do 8º ano da Escola Básica e Secundária Domingos Capela no Encontro em Espinho

 

1-A construção das caravelas, para serem apresentadas no serão cultural, realizado na Escola Básica e Secundária Domingos Capela, sobre o tema "Camões" e a sua obra emblemática «Os Lusíadas», obedeceu a um projeto com base numa memória descritiva. Poderemos saber se algumas das suas obras aqui apresentadas obedeceram a esta dinâmica ou nasceram de forma espontânea?

 

Começo por citar o mundialmente famoso analista de Arte Anatole Jakovsky, que justifica o fato de a arte naïf resgatar a criança que está esquecida dentro do ser humano:“ … A pintura de uma criança não é obra de arte, não passa de divertimento, enquanto que para o pintor naïf trata-se do objetivo de suas vidas. Abolem o tempo e remontam às fontes, a esses paraísos infantis perdidos e, afinal reencontrados…” As minhas obras são criadas e produzidas no estilo Naïf, também conhecida como Arte espontânea, ínsita, ingênua. A expressão espontânea define melhor uma arte que não obedece a critérios determinados pelas academias, mas aplica a emoção e a sagacidade na elaboração da obra, a beleza e o encanto na composição de cores, conta sempre uma história a partir do desenho e usa o olhar da alma na escolha dos temas. O meu processo de criação passa pela planificação do trabalho, com requintes nos detalhes, nas informações, nas intenções. Direi que há imensas etapas neste processo criativo, onde os artistas que bebem na fonte naïf, por exemplo, Matisse, Picasso e outros se inspiram e se aproximam de vários estilos: impressionismo, surrealismo, cubismo, expressionismo. A arte naïf regista formas elaboradas em alguns artistas e formas brüit noutros.

 

2- O que a inspira ou inspirou nos países onde esteve como emigrante (pessoas, locais)?

O que me inspira: os casarios históricos, antigas esculturas nos logradouros públicos. Objetos de arte ou utilitárias. Gente, especialmente. Costumes de raiz, da terra, o jeito de ser do povo. Em Portugal, adoro a primavera, quando chega o tempo em que o sol transpassa as folhas e os troncos das árvores, com uma inexplicável luz que chega por todos os lados e mesmo assim nos dá a luz e a sombra. É diferente da luz do sol do Brasil, ou então parece diferente por ser tão rara. A música me inspira muito, especialmente José Zeca Afonso, em Portugal, as ladainhas, os pregões das feiras e mercados.

3 - Até que ponto poderíamos dizer que há, no país onde esteve, uma arte no feminino em oposição a uma arte no masculino? Ou há uma relação entre género e expressão artística?

Desconfio desses movimentos do feminino e do masculino. Acho que já está fora de tempo. Temos que estar sempre vigilantes, é claro. Mas eu sou uma “dona do meu espaço no feminino, onde quem quiser pode também entrar” e adoro somar, interagir, sempre respeitando o meu ser e o outro. Sei que tropeço nos preconceitos, se pudesse pisava neles.

Por outro lado, na vida social, não sou anarquista, sou até meio burguesa. Já basta a minha arte que não obedece a regras nem instituições.

Sei que há mulheres que sofrem essa divisão, especialmente as de classe desfavorecida por terem pouco poder económico e fracos conhecimentos. Acho que devemos dar a nossa expressão feminina sem confrontos com a masculina, sempre que possível. Juntar sim, separar não. Faço parte de um grupo de 80 artistas do elenco do meu marchand, há mais de trinta anos. Sou uma das primeiras contratadas por ele e, no grupo, há muitos homens, muitas mulheres. Todos somos respeitados, tanto na expressão como no valor dos quadros. Convivemos bem com a igualdade e com o direito de oportunidades. Não creio que Tarsila do Amaral e Di Cavalcante e Portinari tenham sofrido por culpa do masculino-feminino, durante a Semana de Arte Moderna no Brasil.

Acho que quando a cidadania, a responsabilidade, a generosidade estão presentes, aliadas com o saber, com o conhecimento, tudo fica mais claro e mais fácil fica a convivência.

 

4- Para uma artista plástica em comunidade estrangeira, como absorveu a nova cultura do país onde vive e como é que a interligou com a sua cultura de origem?

 

Cheguei em 2008, em plena crise; moro na cidade do Porto, onde sou convidada para muitos movimentos de arte. Sou sempre bem recebida e não me posso queixar. No Brasil, eu já tinha um histórico, um grupo de pertença e ainda o tenho. Percebo e estranho os veteranos portugueses a fazerem exposições sem retorno de vendas. Outros a fazer suas Fundações. Preciso de um tempo para poder responder melhor, mas vejo  um povo que, ou não teve o costume de consumir arte, ou não está a fazer aquisição de arte por conta da crise. No Brasil, quem não pode enfrentar o preço de um quadro, compra e paga em prestações, como é o caso dos intelectuais, dos professores, jornalistas.

 

5- Quais as barreiras que encontrou enquanto mulher- preconceito e enquanto criativa - liberdade?

Eu, pessoalmente, nenhum, nos dois sentidos, caminho normal, sem problemas.

Eu falo como uma portuguesa, já me confundem, pois eu sou assim mesmo, se converso com russo de manhã, à tarde já estou inserida no sotaque. Há uma situação de barreira que tive que enfrentar, mas foi temporária, ou seja, o meu marchand pediu para não pintar igrejas, por que não conseguia vender para os judeus. Depois da minha mudança para Portugal, alguns colegas brasileiros começaram a implicar comigo, por que eu estava a pintar os “meus” adorados azulejos. Pedi que eles, os meus colegas pintores implicantes, espichassem o olhar pelo interior de Minas Gerais e do Recife, da Bahia e de Parati. Pintei um quadro cheio de azulejos e dei o título: “Onde estou: em São Paulo, Rio, Parati ou em Lisboa, Porto, Viana do Castelo?”

 

6- Pensando no  percurso, será que teríamos maior êxito ou maiores oportunidades se estivéssemos nos respetivos países de origem

 

Não acredito que seja uma questão de local, mas sim da qualificação profissional de cada um e da qualidade de ensino, de educação do país que hospeda. Não adianta estar no país de origem se ele não está propício. Como também não adianta esperar melhores oportunidades, sem qualificação profissional e num país em mau estado.

 

7- O que ganharam, neste particular domínio, as mulheres migrantes na sua itinerância por vários universos culturais?

 

Depende muito do projeto de vida. O grande Ariano Suassuna, antropólogo, dramaturgo, historiador, escultor, pintor, escritor, advogado e poeta, conhecido no mundo inteiro, cria e tem a grande energia a seu favor por que vive no Brasil, sorve o Brasil, idolatra o Brasil e toda a sua obra é criada e produzida no seu pequeno local onde nasceu, casou e viveu com a mesma mulher, mais de setenta anos; e lá continua, cheio de vida e de sucesso, sem crise, não acredita na crise. A felicidade está onde ele está. Nunca viaja. Para o exterior. Mas penso que sempre é uma mais-valia, para o processo de criação e produção, conhecer novos mapas.

 

 8- Que importância acha que devemos atribuir às Artes como formas de intervenção e afirmação cívica e humana?

Temporariamente está um pouco enfraquecido, mas não morreu, esse sentimento que, na composição da carne e do espírito, se instala no espírito do ser.

Esse sentimento é uma essência que corre no sangue puro da veia paralela e que o ser humano necessita dele para alimentar a alma. Essa essência é a ilusão que nos sustenta e nos dá a cegueira necessária e generosa, para que possamos suportar a outra veia, onde corre o sangue das dificuldades, do desamor, da falta de paixão e ausência do mistério. Na veia de sangue puro, podemos garantir a morada para as Artes, o saber, o conhecimento, os Artistas e todos os seres bons, sejam doutores ou não.

Entrevista a Cristina Maya Caetano


CRISTINA MAYA CAETANO

 

1- A construção das caravelas, para serem apresentadas no serão cultural realizado na Escola Básica e Secundária Domingos Capela , sobre o tema "Camões" e a sua obra emblemática «Os Lusíadas», obedeceu a um projeto com base numa memória descritiva. Poderemos saber se algumas das suas obras aqui apresentadas obedeceram a esta dinâmica ou nasceram de forma espontânea?

As minhas obras expostas nesta II Bienal de Mulheres em Espinho, tiveram o seu nascimento em poemas. Primeiro escrevi-os e depois a pintura a óleo foi crescendo, acompanhando os versos. Por vezes senti a necessidade de adaptar as tonalidades das cores à escrita, como se o pincel tivessse vida própria e criasse à sua maneira.

O quadro “Florais Outonais” pretende ser uma homenagem ao outono, demonstrando que esta estação onde as folhas caiem e perdem cor, tem uma dinâmica, voz, beleza e cor própria. “Coloridas Folhas”, é um quadro que representa diversas folhas de tamanhos e feitios distintos, símbolo das variadas fases da vida de cada ser humano.

 

2- O que a inspira ou inspirou nos países onde esteve como emigrante (pessoas, locais)?

Nascida em Luanda, Angola, com os meus tenros seis meses, os meus olhos não chegaram a contemplar a minha terra natal. Apenas me recordo de Lourenço Marques (atual Maputo), Moçambique, país onde foi batizada e vivi feliz. Ainda hoje, inspiram-me as corridas e as aventuras de triciclo em que insistia em chocar contra as árvores e esmurrar os joelhos. As bonecas, que adorava vestir e despir, ao mesmo tempo em que da varanda espreitava quem passava. O kukuana o homem velho do saco, onde colocava as crianças que não se portavam bem e as levava com ele. A luz do dia, as cores da terra, os cheiros, a alegria das pessoas, o sol grande e vermelho. A praia com areias finas e brancas e a água do mar quente, onde caminhava com a água a bater-me nos tornozelos. As comidas, como o frango à cafrial, o chocol (especie de moussse de chocolate em lata), as gomas e os chocolates sul-africanos. O ringue de patinagem artistica, onde sonhava aprender a patinar e a dançar com tutus vestidos. O drive in onde com a minha família assistia ao ar livre, dentro do carro aos filmes do Trinitá, bebendo coca-cola e trincando pipocas. As matinés, a leveza das roupas e o pé descalço. “O casamento dos macacos”, apelidado ao tempo de sol, interrompido por uma repentina queda de chuva, onde imaginava uma idílica e pormenorizada cerimónia. A fruta sumarenta, como a manga, papaia, mamão e diversos outros tropicais sabores. O Natal, com uma grande e enfeitada árvore de Natal coberta de grandes presentes. As passagens de ano com pessoas nas varandas e carros a apitarem a saudarem o ano novo.

Tudo isto, eu transporto na minha arte e nos meus escritos (como na Fadinha Lótus, simbolo de magia da minha infância e das bonecas que tinha. O seu lago de nascimento com águas quentes e mansas – O mar de Moçambique e os seus amigos, animais, como tantos que lá havia). Bem como as cores que uso e materiais que me transportam a Moçambique com todo o seu exotismo, e tantas vezes espelhado nos saris de indianas que encontrava na rua, recriando-me para outra cultura, sentir, cheiro e comida picante.

 

3 - Até que ponto poderíamos dizer que há, no país onde esteve, uma arte no feminino em oposição a uma arte no masculino? Ou há uma relação entre género e expressão artística?

Considero que em Moçambique, a predominância do masculino é marcante. O tribalismo, a tradição, o colonialismo e guerra colonial, independência, contacto com conceitos e arte ocidentais, reconstruçao de um país, a procura das raízes, são todos eles fatores importantes numa maior compreensão da cultura moçambicana e transparência de todos os seus componentes. Na arte plástica destacam-se vários nomes como: Pancho Guedes; Azymir Chiluteque com as suas criações que contribuíam para a narrativa da história de Moçambique; Naguibe com destaque para o Mural em homenagem a Samora Machel junto com a sua equipe. Jorge Dias, criador de novas formas de relações culturais e o inesquecivel Mestre Malangatana Valente Ngwenya que levou o nome de Moçambique ao mundo, tendo sido embaixador das artes plásticas, educador, impulsionador, divulgador e criador de oportunidades para a arte e artistas moçambicanos. No feminino, as artistas Fátima Fernandes e a falecida Bertina Lopes com vários prémios internacionais de pintura, são exemplos de sucesso e de integração vivenciais em outros países, respetivamente Portugal e Itália, expressando e alargando a moçambicanidade feminista no mundo

 

4- Para uma artista plástica portuguesa em comunidade estrangeira, como absorveu a nova cultura do país onde estudou ou viveu e como é que se interligou com a sua cultura de origem? E para uma artista plástica estrangeira em comunidade portuguesa?

A cultura daquele país africano, na altura solo Português, pulsava dentro de mim, quer no meu respirar, batimento cardiaco, ou na génese das minhas células. Eu estava em África e África estava em mim. Fugida da guerra colonial, deixei para trás família e a terra que acreditava ser minha. Em Cerejo, aldeia do meu pai, para onde fui residir, deparei-me com valores e costumes culturais distintos aos que estava acostumada e por isso não os reconhecia.  Para mim, a comunidade estrangeira a que me tive de adaptar foi a portuguesa. Com o tempo fui tentando habituar-me com a frequência da escola, ingresso nos escuteiros, faculdade, trabalho e situações próprias da vida, que me levaram a aprender novos costumes, criar defesas e uma compreensão própria ao que me rodeava. Muitos anos mais tarde, regressada a Moçambique, fiz a minha própria catarse: o encontro comigo e com o meu passado. E aí sim, por fim, com raivas desaparecidas, aceitei em plenitude a portuguesa que havia em mim.

Tal como tudo, penso que para uma artista plástica estrangeira em comunidade portuguesa, há que ponderar alguns aspetos. A personalidade da pessoa em cuasa, o país donde é originária e a comunidade onde se inseria. Também é importante se entrou em Portugal, sozinha ou acompanhada de amigos ou familiares, acentuando o fator solidão ou de comunicação. Se constituiu família já em Portugal, permitindo-lhe um contacto e convívio mais próximo com a cultura portuguesa, a integração poderá tornar-se mais acessível. Seja qual for o caso, as vivências, técnicas e gostos pessoais adquiridos noutras fronteiras, sem dúvida poderão e devem enriquecer as artes. Conjugadas com vivências e interações em Portugal, a evolução resultante é salutar e propício para o desenvolvimento das artes.

 

5- Quais as barreiras que encontrou enquanto mulher- preconceito e enquanto criativa - liberdade?

Uma visão diferente da vida e um sonho idealista de a viver: Fazer o que gostava. Deixando para trás emprego e padrões convencionais de vida, experimentei a sensação de muros erguidos, perconceitos e de medos originadados pela incompreensão de uma profissão diferente e de um futuro incerto. Questionando qual o melhor caminho a traçar, a arte gritava dentro de mim. Primeiro em forma de crónicas, escrita científica, depois nos contos infantis, na pintura a óleo, na poesia, nos romances, na ilustração, no teatro, cinema e no contar de histórias. E foi aí que percebi: a arte é sem limites! Senti-me livre e o meu espirito sossegou.

 

6- Pensando no nosso percurso, será que teríamos maior êxito ou maiores oportunidades se estivéssemos nos respetivos países de origem

Não. Acredito que tudo acontece como tem de ser. Nós não somos o passado, mas somos o que somos graças ao passado que tivemos. O passado não é importante, apenas o que fazemos com ele. As dificuldades que travamos, as batalhas que perdemos ou ganhamos, ensinam-nos algo importante para o nosso crescimento evolutivo, e para fortelecidos, encararmos novos desafios.  Acredito que as vivências que tive não seriam as mesmas se tudo tivesse sido de outra forma. Hoje, certamente não seria a mesma pessoa. Provavelmente até nem seria artista...

 

7- O que ganharam, neste particular domínio, as mulheres migrantes na sua itinerância por vários universos culturais?

Aprendizagens culturais e formas diferentes de sensibilidade, ver, ouvir e sentir a vida. Contagiarem-se a si mesmas e contagiarem outros povos sendo veículos portadores de transmissão de novos conhecimentos. Crescerem como seres humanos, olhar de dentro para fora e seguir em frente. Retirar pedras do caminho e construir pontes para comunicar com todos os povos da terra.

 

8- Que importância acha que devemos atribuir às Artes como formas de intervenção e afirmação cívica e humana?

A importância de uma vida. A importância de todas as vidas. Nasce no ser humano. É criado no âmago de cada um. É puro, autêntico, natural. É a voz do sentimento no seu expoente máximo. Não o calem, nem o mutilem! Antes ouçam-no e deêm voz às populações para na arte se expressarem e intervirem na sociedade, observando valores humanos e comportamentos cívicos. Poderão perceber melhor o pulsar de culturas e melhor transmitir a história da civilização. Reinventarem-se a si mesmos, e contribuir para um tão precisado colorir do mundo.

 

 

 

 

 

 

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Mensagem da Drª Maria Barroso


 

Estes encontros e congressos da Associação Mulher Migrante – sob a direção da Dra. Manuela Aguiar e a sua excelente equipa – são de uma grande importância. São, assim, trazidos até ao nosso país onde as suas raízes se inscrevem, as mulheres que noutras regiões do mundo vivem, trabalham e participam nas diferentes instituições que lá se encontram e onde se impõem ao respeito e consideração das pessoas desses países.

Foi muito interessante receber na nossa Fundação essas personalidades que não esquecem as suas raízes e continuam amando este Portugal que também lhes pertence.

Para além do Secretário de Estado das Comunidades, Dr. José Cesário, no Ministério dos Negócios Estrangeiros, também nos deu um grande prazer recebe-los na nossa Fundação que se sentiu honrada com a sua presença.

Aqui na nossa casa também organizámos uma exposição de pintura dessas mulheres muito interessante e que se manteve durante vários dias, após o fecho do Congresso. Exposição que foi muito apreciada pelas muitas pessoas que estiveram na Fundação, quer em visita, quer em participações noutros importantes congressos que aqui se realizam.

Estão, pois, de parabéns os ilustres organizadores do Congresso Mulher Migrante que tanto dignificaram e dignificam a sua ação no nosso País.

 

Maria de Jesus Barroso Soares

Sílvia Oliveira Comunicação


Encontro Mundial Mulheres da Diáspora: Expressões Femininas da Cidadania

Lisboa, Palácio das Necessidades, 24 e 25 de Outubro de 2013.

 

Universidade e(m) Comunidade: Rhode Island College e a Lusofonia

 

Sílvia Oliveira,

Assistant Professor of Portuguese, Modern Languages Department

Rhode Island College,

Faculty Liaison, Institute for Portuguese and Lusophone World Studies, Rhode Island College 

Soliveira@ric.edu

 

O ilustre luso-brasilianista e Professor Emérito da Brown University, Doutor George Monteiro, enquanto convidado de honra na cerimónia inaugural da Sociedade Honorífica de Português de Rhode Island College, prefaciou a sua palestra com um comentário bem humorado de semântica comparativa acerca do termo “descent” em Inglês. Explicando que em Português “ascendência” difere de “descendência”, que a primeira indica a origem e a segunda a prole,  George Monteiro notou o subtil tom negativo afetando “descendência” e o tom positivo envolvendo “ascendência”. Entre os dois movimentos, o ascendente e o descendente, ele preferia o primeiro, o ascendente, e assim, lançava um repto aos estudantes, académicos, e membros da comunidade presentes para que substituissem o termo “Portuguese descent” por “Portuguese ascent”.

Ora, esta sugestão, apresentada e recebida em 2013 com boa disposição, teria sido menosprezada há apenas pouco mais de meio século atrás. Apoio-me nesta pequena história para exemplificar a vitalidade de que goza hoje a herança étnica nos Estados Unidos da América. A ideia de pertença a uma ou várias comunidades étnicas é hoje significativamente valorizada nos EUA, e a expressão desse valor estende-se quer ao plano político quer ao plano pessoal e privado. As ascendências portuguesa e lusófona não fogem a esta regra. 

No meu testemunho hoje farei uma breve exposição sobre o meu percurso como portuguesa nos EUA e sobre a relação entre Universidade e Comunidade, destacando o meu atual trabalho como Professora Assistente de Estudos Portugueses e Lusófonos no Rhode Island College. Pretendo demonstrar que a simbiose entre uma instituição de ensino superior e a comunidade onde se insere é um fator positivo de coesão e avanço social. 

Em 1998, licenciada em Letras pela Universidade do Porto, candidatei-me ao programa de Doutoramento em Línguas e Literaturas Hispânicas da Universidade da Califórnia, em Santa Barbara, iniciando-o em 1999 com bolsa da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Programa PRAXIS 21. No meu percurso académico nos EUA tive a oportunidade de viver em três Estados: Califórnia, Indiana e Rhode Island, onde atualmente resido. Ao longo destes anos, o meu contacto com cidadãos de ascendência portuguesa ou lusófona foi desigual, em direta relação com as características de cada comunidade onde vivi. Refiro em seguida muito brevemente as estimativas do censo comunitário atualizadas no ano de 2010, sobre a  distribuição geográfica de cidadãos americanos de ascendência portuguesa e lusófona nos três Estados americanos: em 2010, aproximadamente 1,405,909 pessoas nos EUA declararam ter ascendência portuguesa; 367,578 das quais encontravam-se no Estado da Califórnia; 4,720 no Estado de Indiana e 101,095 no Estado de Rhode Island. 95,003 pessoas nos EUA declararam ascendência Cabo-Verdeana; 20,680 das quais residindo no Estado de Rhode Island. E ainda, um total de 361,814 americanos declararam ascendência brasileira; 30,252 dos quais no Estado da Califórnia, e 1,706 em Indiana. As disparidades são evidentes e acompanham os padrões de emigração lusófona desde meados do século dezanove para os EUA. Os dois Estados costeiros (Califórnia a oeste e Rhode Island a leste) concentram respetivamente a maior quantidade (Califórnia) e a maior percentagem (Rhode Island, com 10% da população) de americanos de ascendência portuguesa e lusófona, bem como de emigrantes - como é o meu caso.    

Em Indiana, um Estado com reduzida presença lusófona, mas de crescente presença hispânica, tive como desafio implementar um programa de Português na prestigiada Universidade de Purdue. A minha estratégia nesse contexto teve em vista a divulgação da língua e das culturas lusófonas junto dos 40,000 estudantes de Purdue, num programa que apelidei de “Português Global” e servindo uma comunidade de estudantes prioritariamente dedicados a várias engenharias e estudos de economia e finanças. Nesse contexto ainda, a minha estratégia de acesso à comunidade local fez-se exclusivamente através do cinema, tendo iniciado com vários colegas o primeiro ciclo de cinema internacional que entretanto se tornou uma referência local.      

Em 2011 aceitei o desafio de coordenar e expandir o programa de Português no Departamento de Línguas Modernas de Rhode Island College em Providence, capital do Estado de Rhode Island. Se os programas de Português de Purdue e de Santa Barbara serviam uma população estudantil e uma comunidade local que em geral desconheciam a realidade lusófona, sendo ela em todos os aspetos estrangeira, já em Providence e no Rhode Island College aprendi que a língua portuguesa nas suas variantes, e os crioulos cabo-verdeano e guineense, bem como as ascendências portuguesa, cabo-verdeana, guineense, angolana, são presenças vivas quer entre os 9,000 estudantes do College quer na comunidade local. O Estado de Rhode Island é, de facto, dos cinquenta, aquele em que a ascendência portuguesa se expressa mais significativamente em termos percentuais: 10% da população de Rhode Island declara ascendência portuguesa.  

Simultaneamente, Rhode Island College, inaugurada em 1854 e a mais antiga das três Instituições Estatais de Ensino Superior de Rhode Island, apresenta um padrão de envolvimento comunitário que transcende a formação académica tradicional. Apelidada informalmente pela atual Reitora, Dra. Nancy Carriuolo, de Universidade formadora de “profissões auxiliadoras” (como enfermagem, serviços sociais, educação, artes do espetáculo), Rhode Island College reflete a diversidade demográfica da capital do Estado, Providence. Em 2010, Providence era constituída por 50% de população branca, 39% hispânica e 16% negra, enquanto Rhode Island College registava 65% de população estudantil branca, 8.5% negra, 10% hispânica (sendo que outros 10% se recusaram a declarar uma etnia ou raça). Há que mencionar, por comparação, que em Providence existem ainda quatro Universidades privadas, duas das quais com prestígio internacional (Brown University e Rhode Island School of Design), cuja população estudantil é constituída na maioria por estudantes internacionais e estudantes vindos de outros Estados americanos. No Rhode Island College, 80% dos estudantes são residentes de Rhode Island.

Dadas as características do College e da comunidade, desenvolvi um programa de Licenciatura em Estudos Portugueses e Lusófonos que prepara os estudantes para comunicarem em Português ao nível avançado e superior nas ditas profissões auxiliadoras que elas e eles exercerão localmente. Ao mesmo tempo, o currículo da Licenciatura pauta-se pelo conhecimento da cultura, história e literatura, passadas e contemporâneas, das nações de expressão portuguesa, incluindo as várias diásporas. Tanto a fluência linguística como cultural são os objetivos que determinam a organização curricular do programa de Estudos Portugueses e Lusófonos de Rhode Island College.

Já mencionei que Rhode Island College apresenta um padrão de envolvimento comunitário que transcende a formação académica tradicional e dou agora o exemplo do Instituto de Estudos Portugueses e Lusófonos, formado em 2006 e aprovado permanentemente em 2010 por direta iniciativa de vários elementos da comunidade portuguesa e lusófona de Rhode Island. O IPLWS (Institute for Portuguese and Lusophone World Studies) é uma unidade não académica dentro do College que tem como missão apoiar o programa académico de Estudos Portugueses e Lusófonos, estabelecer a ligação entre o College e a comunidade lusófona de Rhode Island, servindo-a e apoiando-a em múltiplas atividades culturais e de formação; e tem ainda como missão documentar e pesquisar temas de interesse local relativos à abundante história cultural das comunidades lusófonas de Rhode Island. Tendo por diretora Marie Fraley, educadora de ascendência portuguesa que exerce simultaneamente funções de relevo em organizações como a PALCUS (Portuguese-American Leadership Caucus of the United States) e Day of Portugal and Portuguese Heritage of Rhode Island; e liaison académica de Sílvia Oliveira, coordenadora do programa académico de Estudos Portugueses e Lusófonos, o Instituto é ainda constituído por um conselho comunitário consultivo que é representativo das várias ascendências e nacionalidades da lusofonia em Rhode Island, bem como de um conselho académico de Rhode Island College. Financeiramente, o IPLWS é administrado pela Fundação de Rhode Island College.

É já vasta a lista de atividades do IPLWS, mas uma merece destaque pela sua relevância internacional. Refiro-me ao Protocolo de Cooperação assinado em 2010 e renovado em 2013  entre o IPLWS/Rhode Island College e a Fundação Pro Dignitate para os Direitos Humanos. O IPLWS, através da equipa constituída por Marie Fraley (Diretora do IPLWS), Doutora Valery Endress (Professora de Comunicação e Jornalismo Político), Doutor Peter Mendy (Professor de História e Estudos Africanos), Doutora Sílvia Oliveira (Professora de Estudos Portugueses e Lusófonos), associou-se ao projeto Rádios para a Paz que a Fundação Pro Dignitate desenvolve na Guiné Bissau desde 2001, com liderança do Dr. António Pacheco, membro do Conselho Consultivo da Fundação Pro Dignitate, jornalista, advogado e formador de jornalistas comunitários na Guiné Bissau. Em 2010 o IPLWS/Rhode Island College organizou uma conferência internacional dedicada ao tema “Rádios Comunitárias e a Construção da Paz” seguida em 2011 de três dias de workshops para jornalistas lusófonos da comunidade local. A equipa de Rhode Island College participou nos seminários “Rádio, Paz e Desenvolvimento” organizados pela Pro Dignitate em Lisboa em 2011, e em 2013 deslocou-se a Cabo Verde para participar nos “Encontros de Tarrafal” que reuniram jornalistas comunitários Guineenses e Caboverdeanos sob o tema “Rádios Comunitárias ao Serviço da Paz e do Desenvolvimento.”

A parceria entre o IPLWS/Rhode Island College e a Fundação Pro Dignitate tem como objetivo principal a formação de jornalistas nos domínios de jornalismo para a paz e de jornalismo comunitário. Os dois cursos de formação profissional e académica, que serão em breve oferecidos por Rhode Island College, servirão não só a comunidade lusófona de Rhode Island como a comunidade internacional (Guineense) cujos laços com a comunidade local são abundantes.

A Fundação Pro Dignitate reconheceu o potencial positivo e transformativo das comunidades  lusófonas de Rhode Island, as quais, mantendo relações estreitas com as respetivas nações de origem ou de ascendência e sendo comunidades ativas na sociedade americana, permitem uma ação com impacto global em prol do desenvolvimento e da paz. Por seu lado, Rhode Island College e o Instituto de Estudos Portugueses e Lusófonos demonstram a importância local e o potencial global de uma instituição de ensino superior que serve diretamente a comunidade em que se insere.

 

 

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Maria Violante Martins Mendes ASAS em Villa Elisa

ASAS em Villa Elisa
 
Os projectos ganham vida quando existe um compromisso seguido de trabalho responsável de quem o realiza. Se esse trabalho não tem retribuição material, mas tão somente solidária, é duplamente valioso, já que se põe  o esforço, a criatividade e a vontade de fazer obra ao serviço de uma causa.
Assim nasceu o projecto ASAS/ Academias Séniores de Artes e Saberes, que tem por finalidade oferecer cursos de aprendizagem e formação artística a um segmento da população que se convencionou designar por  "terceira idade"
O local escolhido para desenvolver este projecto na Argentina foi a Associação "Sinceridad" em Villa Elisa.
O clube "Sinceridad" é um acolhedor  ponto de encontro,  onde as pessoas  mais idosas . podem partilhar actividades sociais e culturais.
Foi neste ambiente que os cursos começaram, com a direcção assumida pelas professoras Maria Violante Martins Mendes, Maria Fernanda da Silva e  Maria Josefina Mac Namara. Com elas, o projecto tem levado a cultura portuguesa a um grande grupo de senhoras portugueses e argentinas, que foi crescendo à medida  que se espalhava a informação sobre o seu funcionamento, convívio caloroso e qualidade do ensino, que são a imagem de marca do projecto ASAS. Fazer amigos e partilhar experiências.
Todas as quartas-feiras vêm até ao clube todas as que procuram aprender as artes e técnicas tradicionais e inovadoras de  crochet, arraiolos, ponto de cruz, tecelagem.
A iniciativa teve o seu começo nos primeiros dias de Maio de 2013 e conta actualmente 37 alunas que, uma vez por semana, à tarde,  se reúnem durante 3 horas consecutivas, ocupando as mentes e as mãos, fora de suas casas e da solidão em que muitas se encontram.
As obras realizadas são o testemunho fiel da capacidade de aprendizagem e dos talentos de um belo grupo de senhoras e da forma competente dos métodos de ensino e dos saberes transmitidos com generosidade  e carinho,  pensados para a vivência do património cultural, que cada docente fez seu e repartiu com as outras.
O projecto é uma parte do programa anual que a nossa associação vem pondo em prática ao longo de quinze anos no nosso país, fiel ao seu objectivo de promover a a juda e a inclusão dos mais necessitados da nossa comunidade portuguesa e argentina.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Docas (Painel Artes)

Desde muito jovem gostava de pintar a óleo, depois a acrílico. como passatempo, para mim própria.
Um dia, decidi inscrever-me num curso de pintura na ARCO, em Lisboa, onde tive como orientador António Senna. Por algum tempo..., mas logo me dispersei por outras artes, por outros passatempos, noutras terras. Trabalhei em Londres, em Luanda, em Paris, em Genebra... E voltei a Lisboa.
Colaborei na organização de exposições, na edição de livros de fotografia...A fotografia está antes de tudo o mais...Na verdade, gosto  de transpor para a tela ambientes captados na objectiva, recriando e reinventando pormenores, cores, perspectivas, sequências... Os meus trabalhos são a procura de um ponto de passagem -  transição de imagens fixadas no papel para a tela, onde ganham uma segunda vida...transição de simples paisagens para uma expressão de sentimentos, de estados de alma
No acrílico guardo memórias do real e do imaginado, do que foi e do que podia ter sido. - do que quero, de uma ou outra forma, partilhar...

Manuela Aguiar (Painel Mulheres na Política)

Quando se fala em direitos da cidadania para as mulheres, é comum pensar directamente no sufrágio, na capacidade eleitoral activa e passiva. E, embora este Encontro ponha o enfoque sobre outras formas essenciais de a Mulher se expressar, como igual ao Homem, em diversos domínios, não deixámos de começar pela sua intervenção no mundo, ou, como prefere dizer a Drª Maria Augusta," nos mundos da política".
 Afinal foi justamente neste espaço que se desenrolaram as primeiras lutas das nossas avós sufragistas, aqui bem  lembradas  pela deputada Maria João Ávila, numa excelente introdução que tantas pistas nos dá para o debate
Desde logo com a citação de Abigail Addams, que já em 1776 se dirigia ao Congresso americano nestes termos:
 "Se as senhoras não receberem cuidado e atenção especiais, estamos determinadas a fomentar uma revolta e não nos consideraremos obrigadas a cumprir a lei , diante da qual não temos voz ou representação".
 
Em Portugal, nos inícios do Século XX, Ana de Castro Osório diria praticamente o mesmo:" Não podemos considerar nossa uma República onde não temos direitos, onde não temos voz para protestar"
 O eco longo do mesmo sentimento de injustiça e exclusão, tantos anos depois, era o sinal de que muito poucas tinham sido as mudanças...ou os ganhos!
E, agora, no século XXI, depois de mutações radicais, no que respeita às leis da igualdade, mas perante números de gritante" imparidade" de género no campo da participação concreta, do acesso a cargos políticos, em quase todos os países, a pergunta é: o que fazer, no País e nas comunidades da emigração?
O Deputado Carlos Gonçalves traça o percurso das emigrantes em França, desde a vida de casa ao envolvimento crescente na vida comunitária e, daí, à vida política, onde hoje representam um terço dos chamados "luso-eleitos"-
Nos EUA, pelo contrário, a presença das portuguesas no universo da política é hoje ainda praticamente nula e o Deputado Tony Cabral dá-nos um justificação que confirmará a tese de  Carlos Gonçalves sobre a relevância da actividade associativa como via de transição para a actividade política:
"Eu acredito que a explicação é a falta de acesso que as mulheres tiveram nas maiores e mais proeminentes organizações comunitárias luso-americanas e nas empresas. Às vezes,  essas mesmas organizações excluem explicitamente as mulheres, por vezes esses grupos dominados por homens simplesmente não fazem com que as mulheres se sintam bem vindas"
Maria do Rosário Loures é um exemplo concreto de passagem do voluntariado associativo à militância política, com a particularidade de ter sido motivada por um homem (o seu ex-marido). O que não me surpreende, pois também eu fui mais motivada a fazer carreira profissional pelos homens do que pelas mulheres da própria família - e o mesmo se diga, depois, da minha ida para o governo e para o parlamento, por insistência de líderes políticos - homens....
A visão comparativa é sempre uma fonte de ensinamentos e aqui poderemos confrontar experiências de vários países e continentes com a nossa, sobretudo a partir da entrada em vigor da Lei da Paridade.
Pelas quotas temos a firme opinião da Deputada Maria João Àvila e da Dr.ª  Maria Augusta Santos, autarca no norte de Portugal e contra a da Senhora Dona Maria do Céu Campos, outro excelente exemplo de uma eleita que começou precisamente pela acção social na cidade de Ravensburg, na Alemanha.
Quanto à discordância sobre as vantagens e inconveniente de uma lei que impõe quotas, fica-me a ideia de que a Senhora Dona Maria do Céu mais do que a sua existência questiona a sua verdadeira eficácia, ao  declarar: "não concordo com as quotas ou coisa parecida. A mulher tem de ter pleno direito a lugares elegíveis e não a fazer número, colocada em lugares onde muitas vezes não tem qualquer hipótese de obter um mandato, nomeadamente nos parlamentos nacionais".
 E logo salienta que "para se entrar na política na Alemanha tem de se ter curriculum, trazer obra e trabalho de voluntariado. 85% das mulheres que exercem cargos na política municipal desempenharam ou continuam a desempenhar trabalho de voluntariado".
Estaremos, com certeza, todos de acordo com a importância de trazer para a política mulheres - e homens - de grande qualidade e com grande dedicação à coisa pública, Mas temos de trazer a debate a questão de saber se um sistema de quotas é ou não compatível com as melhoras escolhas.
E eu creio que há historicamente bons e  maus exemplos da sua aplicação. No espaço da UE, a que pertencemos, têm largamente predominado os bons, dos países nórdicos aos do Sul, onde eu destacaria o caso da Espanha. O nosso tem aparentemente funcionado mais e melhor a nível das eleições legislativas e europeias do que a nível local.
A Dr-ª Maria Augusta, que  conhece de perto esta realidade local, fala-nos, claramente, de" projectos políticos pessoais", de "formas de gestão/liderança dos partidos". da "adopção de estratégia de organização interna e da selecção e recrutamento, assentes na instrumentalização das suas bases de militância". A sua frontalidade leva-me a recordar José Estevão quando denunciava os pequenos  políticos do seu tempo: "o meu programa são os meus amigos. O meu programa é o poder mesmo".
As mulheres são ou não as grandes excluídas dos grupos de "amigos" que mandam em muitas das estruturas partidárias existentes? A imposição da paridade, por força da lei, é ou não um meio eficaz de combater o nepotismo?
É o que proponho que  passemos a debater.